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Lately

Histórias, opiniões, desabafos, receitas...

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Histórias, opiniões, desabafos, receitas...


Miguel Mósca Nunes

28.09.21

É tão interessante ver uma mulher a atraiçoar as suas pares, ou melhor, a boicotar qualquer hipótese de contrariar a ideia de que as mulheres são más umas para as outras, num reality show de grande audiência da televisão generalista nacional. É isto mesmo meus caros! A concorrente está a mandar para o galheiro o esforço de tantas mulheres, numa já longa caminhada, sobretudo porque usa a bandeira da sororidade e utiliza uma plataforma vista por milhões.

Contra a dificílima batalha pela igualdade, não discriminação, e outras lutas desta vida (pelo andar da carruagem, e com estes contributos, nem nos próximos dois séculos haverão mudanças e progressos), temos estas infiltradas, que não são mais do que espias contratadas pelos homens, a boicotar o sucesso das verdadeiras feministas. A concorrente do famoso reality é exímia na arte da mesquinhez e da maledicência, corroendo as relações das restantes mulheres da casa através da intriga. Que coisa tão linda!

Pode dizer-se que estará a exemplificar o que não se deve fazer, mas não me parece que a leitura dos espectadores seja essa. Por outro lado, podemos afirmar que não é por ser uma mulher, há pessoas assim em todo o lado. É verdade, mas a conclusão provável de quem assiste a este desatino é a de que as mulheres são todas iguais e tramam-se umas às outras.

Os machistas esfregam as mãos, mas eu não. É lamentável que uma mulher, supostamente inteligente, se sirva da sororidade para benefício próprio e tenha um comportamento que contraria a causa defendida. A senhora parece um elefante numa loja de cristais!

A sensação que tenho é a de que, no "apalpar do terreno" e no anelo de se posicionar no jogo, atirou com aquela palavra e... "UPS, disse isto e agora tenho de manter a coisa até ao fim, custe o que custar." Custar-lhe-á caríssimo: cem mil euros.

Tenho dito!


Miguel Mósca Nunes

16.09.21

Não posso deixar de me referir, pela enorme alarvidade, ao que recentemente se passou com um certo psicólogo com direito a tempo de antena num canal generalista da televisão portuguesa (conduta que já tem, infelizmente, um historial significativo).

O despautério que aquela criatura vomitou há uns dias é, no mínimo, uma ofensa aos que lutam, todos os dias, pelos direitos das minorias, sejam elas quais forem. As declarações absurdas reflectem um gravíssimo desconhecimento da realidade e o vício comum de fazer generalizações.

Caracterizou os homossexuais como promíscuos, velando por completo o facto de que a promiscuidade é um comportamento que pode assistir a qualquer pessoa e não uma característica agarrada à orientação sexual; justificou a discriminação dos homossexuais na dádiva de sangue alegando esse comportamento promíscuo, como se os heterossexuais não pudessem ser, em nenhuma circunstância, promíscuos. Disse ainda que um concorrente de um reality show é uma "bicha desocupada" (concorrente esse que parece ter levado à Assembleia da República uma proposta para a eliminação dessa discriminação).

Adsurdos deste género têm sido hábito no discurso desta criatura, como o de dizer que 75% das pessoas que consomem canabis envolvem-se sexualmente com pessoas do mesmo sexo, concluindo que sem a canabis não o fariam, e o de associar o veganismo à insegurança e à anormalidade.

Por incrível que possa parecer, temos assistido a condutas muito pouco deontológicas por parte de profissionais da área da psicologia, como a da Dra. Maria José Vilaça, que há uns anos foi notícia por defender e praticar a cura para os homossexuais.

Meus amigos, às vezes prefiro pensar que andamos todos com uma valente bebedeira e que, afinal, estes disparates nunca foram ditos.


Miguel Mósca Nunes

16.09.21

7 de outubro. Na sala dos professores, no primeiro piso do pavilhão principal, Amélia esbracejava e deslocava-se de um lado para o outro, fazendo lembrar uma avestruz.

 ― Como é que é possível?! ― atirou, enervadíssima. ― Ainda não descobriram quem me fez aquele… aquele disparate!

Estava transfigurada, como se de um dragão mitológico se tratasse, quase a deitar fogo pelas ventas.

 ― Calma, Amélia, que havemos de saber ― respondeu António, pouco convencido.

Era professor de matemática e tinha por hábito iniciar as suas aulas com alguns exercícios de ioga. Os alunos adoravam-no. De facto, não estava muito empenhado em encontrar os responsáveis pelo estrago feito na vestimenta da colega, sobretudo porque tinha mais que fazer.

 ― Calma?! CALMA?! ― A professora, irada, esbugalhou os olhos. ― Estragaram-me a saia! Um conjunto que me custou uma fortuna!

 ― O que interessa agora é assegurar que estes... fenómenos não se repitam ― disse António, fazendo um trejeito de sobrancelhas para outros dois docentes que estavam a assistir à conversa.

 ― O meu tailleur ficou arruinado! ― afirmou Amélia. ― Quem é que me resolve o problema? Quem? Como Diretor de Turma, tens de fazer alguma coisa!

 ― Amélia, o que é que queres que se faça se ainda não se descobriu o responsável pelo sucedido?

 ― Não sei, nem me interessa! O que eu quero é que me resolvam o problema!

 A investigação estava difícil, porque a vaga de partidas tinha, entretanto, parado. Já não seria fácil apanhar alguém em flagrante. E, por outro lado, era complicado obter testemunhos de alguma coisa, porque a qualquer pergunta sobre o assunto, os alunos respondiam sempre com um angelical «não sei». Mesmo que soubessem, era improvável que denunciassem alguém.

 E a vida escolar seguia o seu curso, agora com maior sossego. O professor António já tinha refletido sobre a repentina quietude. Passavam, ainda, poucos dias dos acontecimentos, mas achava estranho ter deixado de encontrar graxa nas pegas das portas das salas de aula e pastilhas elásticas nas torneiras das casas-de-banho.

 Para ele não fazia sentido perder muito tempo a encontrar culpados, porque os adolescentes são assim mesmo, gostam de fazer tropelias. E quando lhe contaram a história da «mistela que cheirava a Marrocos», fechou-se na casa-de-banho a rir às gargalhadas. Claro que ninguém soube disto.

 Entretanto, tinha ficado sozinho, porque os outros dois professores tinham saído para dar aulas e a professora Amélia tinha também deixado a sala de professores para regressar a casa, pois terminara o seu dia de trabalho. Pela janela, António conseguia ver o estacionamento à frente do portão da escola, e assistia agora à fúria da desequilibrada criatura, com dificuldade em encontrar a chave do carro que procurava na mala que tinha a tiracolo. Às tantas, começou a dar murros na porta do Renault. Depois, encostou-se ao veículo, numa pausa que demorou uns segundos. Olhou para a chave que já estava na mão, voltou-se, inseriu-a na fechadura, com movimentos bruscos que dificultaram bastante a tarefa de a abrir, deu mais alguns murros na porta, mas lá conseguiu entrar e sentar-se ao volante. «Credo, que a mulher está mesmo descontrolada», pensou.

 O professor sorriu ao ver o carro fazer marcha atrás, aos soluços, até seguir para o Largo da Igreja, a uma velocidade um pouco excessiva para o trânsito local.

 

In "Merinda", Miguel Mósca, Edições Vieira da Silva, 2019


Miguel Mósca Nunes

10.09.21

30 de setembro. No dia seguinte ao susto, os dois amigos quase não falaram durante o primeiro tempo de aulas. Mas, logo ao intervalo, abalaram da sala, preparados para debaterem o acontecimento do dia anterior. Queriam começar a conversar, mas chegou Margarida, a miúda mais estudiosa da turma, que lhes perguntou como tinha corrido a ficha de ciências.

 ― Consegui responder a tudo ― disse a garota, ao mesmo tempo que sorria para João, que considerava o rapaz mais giro da turma ― E vocês?

 ― Acho que me correu bué da bem ― respondeu João, apressado. ― Mas agora vamos comer qualquer coisa ao bar, não é Ricardo? ― perguntou, enquanto dava pequenas biqueiradas no pé do amigo, para ver se ele dizia alguma coisa, em concordância.

 ― Ainda bem ― disse Margarida. ― Também vou, assim tenho companhia.

 Claro que, em dez minutos, e com tanto paleio da colega, não tiveram mais oportunidade de falar sobre a sombra que tinham visto no dia anterior.

 No intervalo maior, sem se atreverem a ir para o tal pavilhão onde tinha tido lugar o acontecimento estranho, muito esquisito e mesmo assustador, que eles não conseguiam explicar, procuraram um local com um pouco de movimento, mas onde pudessem conversar sem que os outros alunos, ainda assim, se apercebessem do assunto.

 ― Mas tu viste o mesmo que eu Ricardo?! ― perguntou João, tentando disfarçar o pavor que estava a começar a sentir. ― Aquilo parecia uma pessoa… e os cabelos… e tinha um chapéu, de certeza que era um chapéu, daqueles de bruxa!

 ― É pá ― respondeu Ricardo, muito espantado ­―, o que é que estás para aí a dizer… uma bruxa?! ― Não queria acreditar no que tinha acabado de ouvir da boca do amigo.

 ― Ricardo ― disse João, começando a falar baixinho ―, eu até sonhei com aquilo. Eu vi muito bem a sombra e ainda não parei de me lembrar do barulho que aquilo fez, quando levantou voo.

 ― Levantou voo?! ― disse Ricardo, que começou a ficar vermelho do pânico que começara a sentir. ― Levantou voo?!

 ― Xiiiiu! ­― atirou João. ― Ninguém pode saber disto! Aquilo era uma bruxa, tenho a certeza!

 ― Achas mesmo? ― perguntou Ricardo, muito assustado. Nem queria acreditar que o amigo estava a colocar aquela hipótese.

― É bué estranho, mas tenho a certeza! ― acrescentou João, olhando o amigo nos olhos. E, de repente, lembrou-se. ― E a velha que está sempre a falar da bruxa?

 ― Sim… e então?! Eu nunca a vi ― disse Ricardo, arregalando os olhos. ― Dizem que a mulher é doida, portanto…

 ― Eu também nunca a vi, mas já me contaram sobre o que ela costuma dizer, e se calhar não é tão doida assim! ― rematou João.

 O assunto principal dos tempos livres, nesse dia, foi a bruxa, mas começaram a recuperar a vontade de pregar partidas, o que os deixava eufóricos.

 Nessa tarde não tiveram aulas, e resolveram ir para casa de Ricardo, porque seria ali o sítio ideal para mais uma barafunda, uma vez que se tratava de uma vivenda e não haveria perigo, pensaram eles, de incomodarem a vizinhança. Mas eis a razão principal: desta vez, as vítimas seriam os próprios pais, e a irmã, de Ricardo.

 Tinham recolhido dez grilos, que encontraram debaixo de dois tijolos, num terreno situado nas traseiras da escola. Guardaram-nos num frasco de vidro, cuja tampa foi perfurada com muito cuidado, para que os bicharocos pudessem respirar.

 Subiram ao primeiro andar da moradia. Entraram no quarto principal, e colocaram cinco grilos dentro da cama dos pais. Depois dirigiram-se ao quarto de Rita, uma adolescente que já não tinha grande paciência para as brincadeiras do irmão, e colocaram os outros cinco grilos dentro dos lençóis de flanela da cama colorida, coberta com uma colcha de patchwork.

 Os dois amigos foram, de seguida, andar de bicicleta, não adivinhando que tinham acabado de armar uma das mais inesquecíveis confusões das suas vidas.

 Eram dez e meia da noite. A Rita estava a lavar os dentes e preparava-se para ler, deitada na cama, até adormecer. Os desgraçados dos pais, Álvaro e Mimi, já estavam também na casa-de-banho, prestes a deitarem-se.

 O malandro do Ricardo fingia estar a dormir, de luz apagada, mas estava à espera, com o telemóvel em chamada estabelecida com João, para que o outro pudesse ouvir toda a reação.

― Espera que está quase… ― ia dizendo.

 Se foi obra do acaso ou da Providência, não sabemos. Mas o facto é que as três inocentes criaturas foram ao mesmo tempo para a cama, num sincronismo inacreditável.

 A partir desse momento, a confusão instalou-se naquela casa e nas redondezas. Foram tantos e tão altos os gritos que, naquela rua, toda a gente ficou em sobressalto, numa aflição tão grande, por não saberem de onde partia tamanha berraria.

― Ai, meu Deus, o que será que estão a fazer àquela gente?! ― dizia uma das vizinhas, acabando de descobrir de onde vinha o alarido. ― Vamos lá ajudá-los! Chamem a polícia!

 Nem Ricardo, nem João, do outro lado do telemóvel, estavam a acreditar em tamanha barafunda. O júbilo inicial transformou-se em alarme, quando começaram a ouvir ao longe as sirenes dos bombeiros. E quando a mãe passou no corredor, amparada pelo pai, aos ais, e a irmã logo atrás, num pranto, a arrastar-se com as mãos na cabeça, o alarme passou a arrependimento e pavor.

 O resultado tinha ultrapassado, por demais, todas as expectativas dos dois amigos. Até nos castigos que o Ricardo levou. Sem televisão, sem tablet e sem computador durante um mês, muita sorte teve em não ficar sem o telemóvel. Mas estes castigos não faziam grande diferença, porque do que ele mais gostava era da rua, da bicicleta e da liberdade de andar sempre para todo o lado com o seu melhor amigo João.

 Estavam a um mês do dia das bruxas.

 

In "Merinda", Miguel Mósca, Edições Vieira da Silva, 2019


Miguel Mósca Nunes

07.09.21

Hoje, mais do que em qualquer outra altura, é preciso dizer não ao Mal. O Mal que persiste em revelar-se na segregação, no repúdio do diferente, na crítica ao que está fora da nossa baliza de crenças, princípios, valores, opiniões.

Desde o 25 de Abril não evoluímos grande coisa, 47 anos de pouca aprendizagem e progressão. As mentalidades continuam pequeninas, a achar que um emprego no supermercado ou a lavar escadas é para gente rasca, e que só se é alguém com um curso superior e um cargo público. O atraso é tal que continuamos a utilizar o Dr. e o Eng.º como prova de que temos nível, estirpe, linhagem. Isto é para gargalhar bem alto! Lutamos pelo título como cão por osso, ao ponto de discutirmos com quem não se nos dirija dessa forma. Altivos, fúteis, mesquinhos, a desfilar carros, roupa, joias, e a publicar fotos de férias no facebook e no instagram.

Para não falar no racismo, idadismo, homofobia, transfobia, ciganofobia, e em tantas outras formas de discriminação. Só porque se é diferente. Destilam-se ódios e críticas nas redes sociais, só porque sim. Haja paciência para tanto imbecil.

O Matay dizia, há dias numa entrevista ao Goucha, que daqui a 50 anos estamos na mesma. Se assim for, que grande merda!

Estamos a precisar, mais do que nunca, de empatia, e de espalhar Amor.

Eu tenho um sonho: que daqui a 50 anos esteja tudo diferente!

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